A SOCIEDADE DOS ADVOGADOS CRIMINAIS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO (SACERJ), por ocasião do Dia Nacional da luta Antimanicomial no Brasil – 18 de maio – vem a público manifestar seu apoio ao movimento e sua preocupação pelas novas diretrizes tomadas pelo poder público.
No final da década de 70, na esteira dos movimentos sociais e políticos que combatiam a ditadura civil-militar que o Brasil atravessava, como a Reforma Sanitária Brasileira - que criou o SUS, e inspirados por outros movimentos internacionais do campo da Saúde Mental, particularmente a Psiquiatria Democrática italiana liderada por Franco Basaglia, grupos como o Movimento de Trabalhadores da Saúde Mental iniciaram uma série de críticas ao deplorável estado dos manicômios: violência, abandono, internações excessivas, indiscriminadas e involuntárias, venda de cadáveres para laboratórios sem o consentimento das famílias, condições precárias de higiene e alimentação, verdadeiros depósitos humanos.
Iniciava-se a Luta Antimanicomial e a Reforma Psiquiátrica Brasileira, que substituiu gradativamente o modelo de internação por uma rede de serviços de atenção psicossocial, possibilitando e garantindo o convívio dos pacientes em sociedade, que teve força legal a partir da vigência da Lei no 10.216/2001, em atenção ao princípio da dignidade da pessoa humana.
Embora visíveis, as mudanças teóricas e práticas na área da saúde mental – apesar dos conhecidos problemas estruturais e da resistência dos setores mais conservadores –, no campo penal as medidas de segurança pouco sofreram alterações. A justiça criminal continuou a operar com os critérios ultrapassados, ancorada na segregação, cega às necessárias mudanças.
Desse modo, é com bastante desassossego que recebemos a Nota Técnica no 11/2019 do Ministério da Saúde, de teor assombroso, repudiada pelo Conselho Federal de Psicologia, por diversas entidades e movimentos sociais, na contramão dos estudos científicos uníssonos nas críticas às instituições totais. O documento extingue o fechamento dos Hospitais Psiquiátricos, preconiza a internação de crianças, o financiamento de aparelhos de eletrochoque pelo SUS, extingue a Política Nacional de Redução de Danos, direciona investimento às religiosas e moralistas “Comunidades Terapêuticas” e ainda declara oposição à legalização das drogas.
Nesse estado de coisas, a SACERJ presta solidariedade ao Movimento em seu dia e endossa a resistência aos discursos segregacionistas e punitivistas, que não trouxeram na história a cura, mas sim dor e sofrimento, sobretudo contra os mais vulneráveis. Como afirmou Basaglia no 1o Congresso de Criminologia Crítica da América Latina, em Maracaibo: “se queremos combater a marginalidade e os desvios, devemos fazer na estrutura social e não como fenômeno isolado que se pretende passar como simples anomalias individuais, onde só uma porcentagem da população tem a desgraça de ser o alvo”.
Rio de Janeiro, 18 de maio de 2019
ALEXANDRE MOURA DUMANS
Presidente da SACERJ